Em pleno período sabático, fazendo minha quarentena após meu último trabalho e acertando os ponteiros sobre meu novo destino profissional – o qual vou anunciar por aqui muito em breve -, resolvi dedicar algum tempo para me atualizar sobre as estatísticas relacionadas à minha área “mãe”, a medicina. Me debrucei sobre alguns números, fiz comparações e análises que me levaram a entender melhor o cenário que estamos vivendo.
Quero compartilhar alguns pontos com vocês e puxar o fio dessa conversa. Vejam só essa comparação: enquanto na China existem 0,11 escolas médicas a cada 1 milhão de habitantes e nos Estados Unidos 0,58 escolas por milhão de habitantes, aqui no Brasil a proporção é de 1,67 escolas por milhão de habitantes. Analisando a linha do tempo, percebemos como o crescimento se acelerou nos últimos anos. No período entre 1808 e 1994 foram abertas 80 escolas médicas no Brasil, já na fase entre 1994 e 2023 surgiram mais de 300 escolas.
Mais um recorte, agora comparando públicas e privadas: a oferta de vagas em universidades públicas de medicina subiu 64% entre 2003 e 2023, enquanto em instituições privadas a oferta cresceu 358% nesse mesmo período (20 anos).
Isso significa que o nosso mercado nunca esteve tão repleto de faculdades de medicina e, consequentemente, tão abastecido de mão de obra especializada. De acordo com dados da Associação Médica Brasileira (AMB), o Brasil conta com 560 mil médicos, dos quais 100 mil têm menos de cinco anos de formados. Este total representa um acréscimo de 81% em relação ao número de médicos em ação em 2010. O ritmo de crescimento deste nicho específico é maior do que o da população em geral.
E já que me empolguei com os números, trago só mais um: segundo as projeções de um estudo feito em parceria pela Universidade de São Paulo (USP) e o Conselho Federal de Medicina (CFM), o Brasil deve contar com 800 mil profissionais médicos em 2030.
“Ah, Marcello, mas qual é o problema? Não é ótimo que estejamos bem servidos na área da saúde?”. Sem dúvida! O que me preocupa, e por isso resolvi trazer essa reflexão aqui, é onde todos esses profissionais irão trabalhar. Porque sabemos que existe um processo natural de afunilamento quando todos correm para o mesmo lado. Neste caso, o “lado” para onde a maioria dos recém-formados migra é o da residência médica. Porém, o número de vagas disponíveis corresponde a apenas 8% do total de médicos no país. É matemático: não há vagas para todos seguirem este caminho.
Por isso, acho importante expandir os horizontes. É fundamental que desde a época da faculdade os alunos sejam apresentados a diferentes possibilidades e incentivados a pesquisar sobre onde estão as oportunidades, hoje distribuídas em tantos novos segmentos. É um mercado diferente do que era há 20, 30, 40, 50 anos. Isso significa que a postura e a formação de quem entra no mercado também tem de ser outra. Em conversas recentes que tive com as novas gerações, entendi que quase a totalidade dos jovens médicos desconhece temas como ética médica, direito médico, negócios, empreendedorismo, economia, finanças, tampouco sabem como fazer a gestão da própria carreira.
Torço para que os novatos tenham disposição e interesse em correr atrás e desbravar novos nichos, porque as oportunidades existem em muitos segmentos de mercado.
E você, Doutora ou Doutor, o que acha?